domingo, 25 de maio de 2008

Como si fuera esta noche la última vez

Poder ouvir a Cesaria Evora, a diva dos pés descalços ao vivo é um privilégio. Por essa oportunidade a Virada Cultural já me valeu a pernada.
Na companhia de bons amigos no início da noite, as ruas do centro ainda estavam calmas. Pra completar encontrei meu parceiro Antonio. Bailamos e guiados pela bela voz,em devaneios musicais ....nos transportamos a Cabo-Verde.

É doce morrer no mar

É doce morrer no mar
nas ondas verdes do mar(2x)

A noite que ele não veio foi
foi de tristeza para mim
saveiro voltou sozinho
triste noite foi para mim

É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar

Saveiro partiu de noite e foi
madrugada não voltou
o marinheiro bonito
sereia do mar levou

É doce morrer no mar
nas ondas verdes do mar

Nas ondas verdes do mar meu bem
ele se foi afogar
fez sua cama de noivo
no colo de Iemanjá

É doce morrer no mar
nas ondas verdes do mar

Cesaria Evora
Composição: Jorge Amado/Dorival Caymmi

Participacao especial de Marisa Monte


Seo Licínio - Saco do Mamanguá - Paraty - RJ

Seo Licínio é um poeta. Escreve músicas e toca uma ciranda que é uma beleza!
Já tocou muito nos bailes e festas de Paraty. Hoje seu sonho é montar um grupo e voltar a tocar. Enquanto isso é o barqueiro que leva e traz as crianças da escola para a casa.

sábado, 24 de maio de 2008

Caiçaras de Paraty

Essa poesia aqui foi enviada por uma amiga, que é mais do que amiga, é companheira na remada caiçara de nossas vidas!
Obrigada amiga!

A você amiga... Antonia que brilha!!!
Que me inspirou hoje...
Que me ajuda a crer...
Crer na conexão...
Crer na ação...

E aos caiçaras de raça de Paraty.

"Caiçaras de Paraty
Que além de seus caminhos
cavam pelo mar suas histórias
suas esperanças e suas aspirações

Que carregam em suas canoas seus pescados
mas também seus sonhos e seus pecados

Que remam na busca do alimento
Mas também da salvação

Que tecem poesias no jazigo
E aprendem no mar a viver o infinito.



Assim como nós..."


cirandaeamor


Por Laise

domingo, 18 de maio de 2008

O Barco Embriagado

Enquanto eu acompanhava rios impassíveis,
Não me senti mais guiado pelos rebocadores :
Índios aos berros os tomaram por alvo,
Pregando-os nus aos troncos de cores.

Não me preocupei com todas as equipagens
Carregando trigo flamengo ou algodão francês.
Quando com meus rebocadores acabou a gritaria,
Os rios me deixaram descer onde queria.
Através dos furiosos murmúrios das marés,
No outro inverno, mais surdo que mentes infantis,
Eu corri ! E as penínsulas desgarradas
Nunca tiveram tão triunfais algazarras...

Sei de céus que estalam em raios, de tormentas
Ressecas e correntes : sei da noite e do Alvorecer
Exaltado tal o revoar de miríades de pombas,
E vi certas o que o homem acreditou ver !

Vi o sol poente, manchado de horrores místicos,
Iluminando longos coágulos violetas,
Como atores de dramas muito antigos
Ondas distantes rolando arrepios de frestas !..

Vi fermentar enormes pântanos, ardis
Onde entre os juncos um Leviatã apodrece !
Despencam águas em meio a calmarias,
E horizontes para os abismos descem !
Queria mostrar às crianças estas douradas
Na onda azul, estes peixes dourados, estes peixes cantantes.
- Espumas de flores embalaram minhas ffugas
E inefáveis ventos me alaram por instantes.

Às vezes, mártir cansado dos pólos e das zonas,
O mar cujo soluço adocava meus vagueios
Me alçou suas flores de sombra de ventosas amarelas
E eu ficava, qual mulher de joelhos...

E eu, barco perdido sob os cabelos das angras,
Pelo furacão no éter sem pássaro lançado,
A quem os Monitores e os veleiros das Hansas
Não teriam a carcaça ébria de água resgatado;

Eu que tremia, ouvindo gemer de cinquenta léguas
O cio dos demônios e dos abismos estreitos
Tecelão eterno das imobilidades azuis,
Lamento a Europa dos antigos parapeitos !

Se desejo uma água da Europa, é o charco
Negro e frio onde no crepúsculo perfumado
Cheio de tristeza um menino agachado
Como borboleta de maio solta o tênue barco.

Não posso mais, banhado por vossos langores, ô ondas,
Levar seus vulcos dos carregadores de algodões,
Nem atravessar o orgulho das bandeiras e das chamas,
Nem nadar sob os horríveis olhos dos pontões.

1871

Arthur Rimbaud

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Ilha das Cobras - Paraty- RJ

Arueira

Vim de longe, vou mais longe
Quem tem fé vai me esperar
Escrevendo numa conta
Pra junto a gente cobrar
No dia que já vem vindo
Que esse mundo vai virar
Noite e dia vêm de longe
Branco e preto a trabalhar
E o dono senhor de tudo
Sentado, mandando dar.
E a gente fazendo conta
Pro dia que vai chegar
Marinheiro, marinheiro
Quero ver você no mar
Eu também sou marinheiro
Eu também sei governar.
Madeira de dar em doido
Vai descer até quebrar
É a volta do cipó de arueira
No lombo de quem mandou dar.

Geraldo Vandré

Aqui estás

Graça Divina
Escrever-te
Ouvindo tua voz
A ler estas palavras

Que graça e que gosto!
Em páginas brancas
Puras
Escorrer meus sentimentos

Puro
Límpido
Cristalino feito a água
que me invade
pela manhã
Do rio da vida

Que gosto!
Sentir teu sentido
Sonhar teu sorriso
E desenhá-lo em
alvas folhas

Divino
Saber que ao findar
a escrita
Tu já leras
Pois aqui estás!

sábado, 10 de maio de 2008

Oceano

Assim
Que o dia amanheceu
Lá no mar alto da paixão,
Dava prá ver o tempo ruir
Cadê você?
Que solidão!
Esquecera de mim?

Enfim,
De tudo o que
Há na terra
Não há nada em lugar
Nenhum!
Que vá crescer
Sem você chegar
Longe de ti
Tudo parou
Ninguém sabe
O que eu sofri...

Amar é um deserto
E seus temores
Vida que vai na sela
Dessas dores
Não sabe voltar
Me dá teu calor...

Vem me fazer feliz
Porque eu te amo
Você deságua em mim
E eu oceano
E esqueço que amar
É quase uma dor...

Só sei viver
Se for por você!


Djavan

Nascer

Sinto me diferente. Necessito escrever sobre essa experiência divina que vivi hoje. Creio que depois de tanta lágrima, de tanto remar, de tanto buscar, cheguei ao outro lado do rio. Vi a face da luz do amor. Ela me iluminou e foi uma luz tão forte, tão forte, que meus olhos se puseram a lacrimejar. E foi limpando toda a sujeira que não me deixava enxergar. Cada gota que escorria era uma felicidade e uma descoberta. O mundo passou a ter sentido. A vida passou a ter sentido. Os poetas, o cinema, a vida , o mar, os marinheiros, os pescadores, os peixes, tudo passou a ter um sentido. Um outro sentido. Um verdadeiro sentido para mim. A fé brilhou como ouro. E percebi quão valiosa é. A esperança surgiu, limpa e nova e reconheci teu valor. Não me preocupo mais com o final da reta. Me ocupo em começar a construí-la. E agora tenho minhas mãos, meu coração e todas as canções. Tenho o pensamento afinado com Deus e me basta! Construirei as ferramentas, apanharei o material bruto, pois tenho agora a ajuda deste grande arquiteto e a luz do amor me guiará.

21/04/08

O encontro

Chegou tão de repente
Foi ficando
Devagar
Como o amanhecer

Veio
Quebrou os limites
Trouxe paz
Felicidade e santidade

Parte que faltava
Deixou dias e noites
Completos
Trouxe maturidade

Cresce a acada dia
Toma conta de tudo
É sonho?
Não!
Está aí
Agora
Dentro e fora
De mim
Já me faz parte
Oh amor...
Aproveitando a paráfrase de Drummond na postagem anterior pubico aqui a ultima poesia dele que me veio aos olhos:

As Sem-Razões do Amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
E nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
E com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
É semeado no vento,
Na cachoeira no eclipse.

Amor foge a dicionários
E a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
Bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
Nem se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
Feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
E da morte vencedor,
Por mais que o matem (e matam)
A cada instante de amor.

Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 6 de maio de 2008

SELVAGEM

A busca pelo selvagem partiu da provocação de um olhar. Um olhar atento, um olhar profundo. Um olhar de bicho quando espreita a caça. Apartir dai tomou todos os meus sentidos. Hoje posso dizer que a provocação deste olhar foi um grande presente de ano novo. Desde então vivo uma eterna busca. Porque mecheu tanto comigo? O que significava aquele sentimento? E mais ainda porque me identificava tanto com ele? Fui devorando livros e casos de amores selvagens, naturais, silvestres. Repito que foi um grande presente. Ganhei de volta a literatura brasileira, deixada na estande do colégio. Comecei tudo denovo, um renascimento. Voltei para os clássicos e descobri um mundo encantado. O mundo da literatura, que eu na verdade nunca tinha me dado conta. Encontrei muitas pérolas e uma delas foi José de Alencar. Críticas à parte. Esse grande romancista me trouxe pra perto da vivência de nossos índios e das minhas raízes. Ler teus romances indianistas me despertaram para a riqueza do imaginário de meus ancestrais, e com tuas histórias me transportei para as florestas, mares e rios. E consegui compreender o que me preendeu aquele olhar. A pureza da sua intensidade e a verdade que existe na pureza. Era isso que me faltava. E no meio do caminho tinha um tigre. Tinha um tigre no meio do caminho....

Hoje , voltava do trabalho lendo Ubirajara de José de Alencar, me deparei com algumas histórias sobre o mar, sobre a sua representação mítica para os tupinambás e pensei que seria muito bom compartilhá-las!!!! Ah tem uma também sobre mulheres fortes! Fortes como as ondas do mar!


Tupinambás!

GUERREIROS DO MAR

"Ele contou o que havia aprendido nas praias do mar, habitadas pela valente nação dos tupinambás, descendentes da mais antiga geração de Tupi. Os pajés dos tupinambás lhe disseram que nas águas do pará sem fim vivia uma nação de guerreiros ferozes, filhos da grande serpente do mar.
Um dia esse guerreiros siriam das águas para tomarem a terra às nações que a habitam; por isso os tupinambás tinha descido às praias do mar, para defendê-las contra o inimigo.
Os guerreiros do mar*, também tinhas sua guerras entre si como guerreiros da terra. Então as águas pulavam mais altas do que os montes; seu estrondo era como o trovão.
Jurandir contou mais que nas praias do mar se encontrava uma resina amarale, muito cheirosa*, a qual a grande serpente criava no bucho.
Os tupinambás faziam dessa goma contas para seus colares; Jurandir mostrou a pulseira que lhe cingia o artelho, presente de um guerreiro daquela nação.
Essas contas tornavam o pé do guerreiro ágil na corrida, e protegiam o viajante contra os caiporas da floresta, que apartavam-se de seu caminho"

* GUERREIROS DO MAR - tradução da palavra tupi caramuru com que os tupinambás da Bahia designaram Diogo Álvares Correia. Caramuru é composto de cará, alteração de Pará, mar, e môro, gente; homem do mar. Os selvagens acreditavam que as águas eram habitadas, e daí nasceu a lena da mãe-d'água, que se transmitiu à raça invasora. Nada mais natural do que chamarem ao primeiro branco, que lhes apareceu surgindo do oceano, Caramuru - o guerreiro do mar.

* RESINA AMARELA, MUITO CHEIROSA - é o âmbar, que os tupis chamavam Piraoçurepoti, e de que so tempo do descobrimento abundavam as ribeiras do mar, nas províncias do Norte.

PARÁ SEM FIM

"A primeira água em que Jaçanã, sua mãe, o lavou, quando ele rasgou-lhe o seio, foi a do grande lago onde Tupã guardou as águas do diluvio, depois que as retirou da terra.
Ainda Jurandir não era um caçador quando ele se banhou no pará sem fim*, onde os rios despejam a sua corrente e cujas águas, quando dormem, se mudam em sal.
Duas vezes Jurandir seguiu o pai dos rios, desde a grande montanha onde nasce, até a várzea sem fim que ele enche com suas águas.
Ele viu o grande rio combater com o mar, são guerreiros azuis, com penachos de araruna; vêm do outro as águas do rio; são os guerreiros vermelhos com penachos de nambu.
Começa a batalha. Os guerreiros se enrolam, como a corrente da cachoeira, batendo no rochedo; a terra estremece com o trovão das águas.
Mas o grande rio agarra o mar pela cintura. Arranca do chão o inimigo; carrega-o nos ombros; solta o grito de triunfo.
Por muito tempo os tetivas*, que habitam a sobre as árvores, vêem passar correndo as águas do mar: são os guerreiros azuis qeu fogem espavoridos e vão esconder-se na sombra das florestas."

* PARA SEM FIM - par, diz Humboldt, cit., pág 384, é um radical guarani e exprime água. Pará creio eu que significou a grande abundância d´água, e foi primitivamente empregado para designar os lagos e porventura as vastas inundações do vale do Amazonas. Mais tarde os selvagens acrescentaram-lhe o verbo nhanbe, correr e disseram pará-nhanbe, donde paranãn, para designar as grande massas d´água corrente, isto e os rios caudalosos. Foi a subistituição do p pela análoga m que produziu o nome de Maranhão, acerca de cuja etimologia se inventaram tantas extravagâncias.
* TETIVAS - os tetivas habitam os olhos das palmeiras e de outras árvores: põem-lhes terra e acendem fogo. Humboldt, cit., pág. 283.


Fonte: http://www.tribosdegaia.com.br/htm/artigos/zoe06.htm

Senhoras de seu corpo

"Jurandir* também viu a terra onde habitam as mulheres guerreiras, senhoras de seu corpo*, que vivem embaixo das águas do grande rio.
Só elas sabem o segredo das pedras verdes, que tornam os guerreiros cativos de seu amor, sem privá-las da liberdade.
Por isso, todas as luas, grande número de guerreiros as visitam em sua taba; e elas guardam para os mais valentes a flor de sua beleza.
Quando chega o tempo de vir o fruto do amor, guardam somente as filhas; e enviam aos guerreiros os filhos, donde saem os maiores chefes.
Feliz o guerreiro que acha uma terra valente e fecunda pra a flor do seu sangue. O filho será maior do que ele; e o neto maior do que o filho.
Sua geração vai assim crescendo de tronco em tronco; e forma uma floresta de guerreiros, onde o último cedro se ergue mais frondoso e robusto, porque recebe a seiva de seus avós"

- Passagem do livro Ubirajara de José de Alencar, momento em que o grande guerreiro Ubirajara, chamado na ocasião de Jurandir, se encontra na hospitalidade da taba do chefe de uma outra tribo, neste momento ele se depara com Araci, a bela virgem caçadora. Inicia a maranduba do hóspede, uma espécie de discurso, onde conta uma história de guerra ou viagem por meio de versos.

*JURANDIR - contração da frase Ajur-endy-pyra, o que veio trazido pela luz.

*SENHORAS DE SEU CORPO - metáfora tupi. No varão a parte nobre era o sangue; pelo que ele dizia do filho, tayra, o filho do meu sangue; e para indicar a independência diziam tayguara, que os dicionários traduzem livre, mas que literalmente significa, senhor do seu sangue. A mulher que dizia do filho membyra, o gerado de meu ventre; devia pela mesma razão usar a expressão análoga para exprimir sua liberdade, e dizer membyjara, senhora de seu ventre, que eu por elegância traduzo menos literalmente, sehora de seu corpo.

domingo, 4 de maio de 2008

Apaixonite Aguda

Quando estou longe
Quero ficar perto
Quando estou perto
Quero ficar dentro
Quando estou dentro
Quero ficar mudo
Quando estou mudo
Quero dizer tudo

Itamar Assumpção
Preto Braz

O beijo que não te dei

O beijo que não te dei
Teu olhar não encontrei
O vazio
Ficou
Dia e lunas
Esperei
Do mar o marinheiro
Da boca o escudeiro
Viraria a rota
Acalentaria
Meu sono
No beijo que não te dei
Mora o sol e a esperança
No beijo que não te dei
Teu mel
Segredos
Acordados
Aguando
O bom do amor...

XCIV

Si muero sobrevíveme con tanta fuerza pura
que despiertes la furia del pálido y del frío,
de sur a sur levanta tus ojos indelebles,
de sol a sol que suene tu boca de guitarra.

No quiero que vacilen tu risa ni tus pasos,
no quiero que se muera mi herencia de alegría,
no llames a mi pecho, estoy ausente.
Vive en mi ausencia como en una casa.

Es una casa tan grande la ausencia
que pasarás en ella a través de los muros
y colgarás los cuadros en el aire.

Es una casa tan transparente la ausencia
que yo sin vida te veré vivir
y su sufres, mi amor, me moriré otra vez.

Cien sonetos de amor
Pablo Neruda

O homem e o mar

Homem livre, hás de ser sempre amigo do mar,
O mar é teu espelho e contemplas a mágoa
Da alma no desdobrar infindo de sua água,
E nem ela abismo é menos de amargurar.

Apraz-te mergulhar tua própria imagem;
O olhar o beija e o braço o abraça, e o coração
No seu próprio rumor encontra distração,
Ao ruído desta queixa indômita e selvagem.

Mas ambos sempre sois tenebrosos e quedos:
Homem, ninguém sondou teu fundo sorvedouro,
Mar, ninguém viu jamais teu íntimo tesouro,
Porque muito sabeis guardar vossos segredos!

Porém passados são evos inumeráveis
Sem que remorso ou pena a vossa luta corte,
De tal modo quereis a carnagem e a morte,
Ó eternos rivais, ó irmãos implacáveis!

As flores do mal - Charles Baudelaire

O ultimo sol

Lembro-me bem
O dia do ultimo sol
A sonhar tudo o que o amor pode realizar
Um sonho acordado
E vivo
Gozei séculos de afagos
Em teus olhos
E finalmente me cobri de flores
Girando no teu céu
Em canto e dança
Sensual
Grande prazer dos sentidos
Ritmo vibrando no mais fundo de mim mesma

Oh! Maravilhoso isolamento
De silêncios profundos
Calma e larga ausência
Banhando-me na água do verdadeiro juramento

Ah! Como é doce naufragar-me nesse mar!

sexta-feira, 2 de maio de 2008

MESTRES



Fonte: http://www.viniciusdemoraes.com.br/

Contemplações do poeta ao cair da noite

Ainda há pouco, a reler a página admirável de frei Luís de Sousa, cujo título, possivelmente dado pelos antologistas Álvaro Lins e Aurélio Buarque de Holanda, é (se em vez de poeta ler-se arcebispo) o mesmo desta crônica, tive a alegria de verificar quão parecidas eram as minhas noites de solidão em Montevidéu, com as de frei Bertolameu dos Mártires, mais de três séculos antes. Como o santo arcebispo, também eu passava o dia todo dando expediente, quiçá de menos hierarquia, pois enquanto ele devia andar às voltas com despachos celestiais, tinha eu a meu cargo despachos marítimos e terrestres, além da firmação de passaportes e faturas e da contagem diária dos emolumentos consulares.
E como fazia ele, com relação às coisas divinas, eu, ao fechar-se a noite sobre o cerro que provocou no descobridor a exclamação nominativa da cidade, depois de um curto trajeto de automóvel até o bairro de Pocitos, onde tenho meu apartamento num sétimo andar "pagava-me o peso do dia, e do trabalho com um passatempo malconhecido no mundo, e ao menos buscado de poucos (e ainda mal, que se muitos o buscaram fora melhor ao mundo)". Entregava-me a uma profunda contemplação da bem-amada ausente. Esta era a maneira de vencer a distância irremediável que se estendia diante dos meus olhos voltados para o norte e que às vezes buscavam, na linha descendente de Alfa e Beta de Centauro, o ponto exato onde ela, de sua janela sobre o parque, devia também pensar em mim.
E não se maravilhe ninguém de que eu, tal o arcebispo, passasse com tanta facilidade dos negócios à contemplação. Não tinha, é claro, "dês da primeira idade feito hábito neste santo exercício". Mas o que me faltava em penitências, sobrava-me em ternura e querer-bem. E se nele "este antigo costume lhe trazia a viola do espírito tão temperada sempre, que em qualquer conjunção que largava o negócio, logo a achava prestes para sem detença entoar as músicas da Celestial Jerusalém, e ficar absorto nos prazeres do divino ócio", eu por mim tinha sempre bem afinado o meu violão Del Vecchio, e me comprazia em machucar-me as saudades com os doridos acordes de tantas canções feitas para a bem-amada. E assim não me era por nada difícil passar de faturas a doçuras, e desligar-me da rotina do trabalho para a comunhão com a amiga distante, num lento evolar-se do meu ser empós sua adorável imagem, que às vezes parecia corporificar-se na lua que estava no céu. E não era incomum ficarmos, eu e a lua de Montevidéu, em doce conúbio, ela dilatando os espaços com os raios de seu amor, eu esvaindo-me de amor em seu luar. Pois era aquele o luar do meu bem no seu pungente exílio, a segredar-me que, mesmo ausente, ali estava para iluminar as minhas horas; e eu tivesse paciência e a esperasse dentro e fora de mim, que ela se vestira toda de luz para o nosso futuro encontro; e não me desesperasse, pois estava próximo o dia em que nunca mais nos haveríamos de separar.
De outros turnos - como no caso de frei Bertolameu, que dessem-lhe azo os negócios, "subia sobre tarde a um eirado que mandou fazer em uma casa das mais altas do Paço; e como o passarinho, que depois de andar todo o dia ocupado na fábrica de seu ninho, quando vai caindo o Sol, e as sombras crescendo, estende as asas pelo ar, dando umas voltas alegres, e desenfadadas, que parece não bole pena, ou posto sobre um raminho canta descansadamente", - também eu deixava-me estar no terraço de meu apartamento, um dos mais altos de Pocitos: e feito ele que, à imagem da avezinha, "depois de alargar os olhos pelas serras e outeiros, que do alto se descobriam, estendia os de sua alma às maiores alturas do Céu, voava com a consideração por aquelas eternas moradas, desabafava, e em voz baixa entoava de quando em quando alegres Hinos" - eu por minha vez, ante a idéia de compartilhar com a bem-amada a visão dos amplos espaços crepusculares do estuário do rio da Prata, e de rodeá-la, com meus braços dentro das iluminações do poente oriental, punha-me, tal um menino que, ai de mim, já não sou mais, a tamborilar com os dedos e a cantar com ela alegres sambas do meu Rio, que não é da Prata nem do Ouro, mas que é cidade de muito instante, e em hoje mora, em casa única, o meu antes triste e multifário coração.





Para viver um grande amor (crônicas e poemas)
Vinicius de Morais

Sexta-feira com paixão

Minha tensão dinâmica
Me dá teu equilibrio
Um caminho de paz
Meu tesão permanente
Me dá teu fogo
Te dou a fogueira

Encantado...
Meu tigre alado
Me agarro em teus ramos
E vôo em tua selva

Devagar me vitaliza
Feito sol e vento
Brisa do mar
Sândalo divino
Sinto tua quentura
Fera minha
Me sacia ...

-LXVII-

La gran lluvia del sur cae sobre Isla Negra
como una sola gota transparente y pesada,
el mar abre sus hojas frías y la recibe,
la tierra aprende el humedo destino de una copa.

Alma mía, dame en tus besos el agua
salobre de estos meses, la miel del territorio,
la fragancia mojada por mil labios del cielo,
la paciencia sagrada del mar en el invierno.

Algo nos llama, todas las puertas se abren solas,
relata el agua un largo rumor a las ventanas,
crece el cielo hacia abajo tocando las raíces,

y así teje y desteje su red celeste al día
con tiempo, sal, susurros, crecimientos, caminos,
una mujer, un hombre, y el invierno en la tierra

Cien sonetos de amor
Pablo Neruda


Foto: Nahuel

Vida

Não compreendo
Lagrimas deslizam
Pela felicidade
De meu rosto
Ao sentir teu coração
Amanhecendo junto ao meu

Não entendo
O que dizem
Mas cada gota
Renasce em mim
A vida

Dentro da enternidade
Sem mistério
Reconheço-te
Meu porto
Meu ninho
Assim devagarzinho
Vai surgindo
A beleza
Desta manhã

Tua Onda

Fluxo e refluxo
Retorno marulhado
Encontro de duas ondas
Vai
Vem
Se encontram
Se unem
Se fundem
Na gandaia
Beira de praia